quarta-feira, 28 de maio de 2008

O casamento da filha, final

- Só isso mãe. É simples!

- Oi, Ângela, fala. Do que você precisa? Sua meia-calça rasgou, não foi?

- Não, não, não é isso. Lembra aquela fantasia de secretária que eu usei em algum carnaval... deve fazer uns vinte anos...

- Lembro, como não? Mas Ângela, olha a hora, que raios você vem falar dessa fantasia agora?

- Não me pergunte, mãe, é uma surpresa, ta bom? Você ainda guarda a fantasia aí, não guarda?

- Guardo sim, ta numa sacola, mas deve estar tudo amassado, e o cheiro...

- Não tem problema. Olha, eu estou pronta, só vou pôr o vestido. Em quinze minutos to aí. Só traz a fantasia, ta bom?

Foi o tempo de uma respiração entre o desligar do telefone e o trancar da porta. Cambaleando no salto, tomando cuidado para nenhuma mecha do cabelo rebelde soltar-se no penteado, ela dirigiu-se ao ponto de táxi da esquina e pegou o único veículo que restava lá. Em quinze minutos exatos estava à porta da casa de sua mãe.

- Ué?! De táxi? – e, entrando no carro - Não me diz que você pensa em ficar bêbada no casamento da sua filha, não me diz, Ângela. Não vai me dar vexame, pelo amor de Deus. E cadê Fabiana?

- A Fabiana se arrumou na mãe do Cristhian. Ia com ela, disse que não confiava em mim.

- Não vamos condená-la, não é?

(pausa)

- Você trouxe a fantasia?

- Ta aqui. Mas posso te garantir que uma secretária sexy, mesmo que de brincadeira, não é propícia para um casamento.

- Me dá a sacola.

- Eu me lembro bem, que tristeza aquele carnaval. As meninas todas arrumadinhas, de princesa, odalisca... Mas você enfiou na cabeça que queria ir de secretária sexy

Dona Carmen continuou falando sobre a fantasia e o carnaval, mas Ângela não escutava mais. Ela só remexia a sacola. Tirava caneta, vestido, sapato, e, finalmente...

- Aqui!!

Por um momento Dona Carmen trocou o tom de bronca pelo de curiosidade. Disse, admirada:

- Filha, o que você vai fazer com essas unhas postiças?

- Vesti-las, mãe. Não vê que as minhas estão horrorosas?

- Meu Santo, minha Nossa Senhora, Deus do céu! O que houve com as suas unhas???

- Longa história. Agora só me ajuda a colá-las. Temos dez minutos até a Igreja.

- É, parece ser a melhor opção mesmo. Só não estou achando essa cor muito apropriada...

- E por acaso você tem outra alternativa?

Deu tempo. Chegaram à Igreja às 20h15. A cara de Fabiana ao receber o abraço da mãe não era de raiva. Não. Era exatamente a cara que Ângela temia. A que ela se esforçava havia cinco anos para nunca mais precisar ver, mas, por algum motivo alheio à sua vontade, sempre estava lá. Era uma cara de nojo e sagacidade; uma espécie de “eu não disse” arrogante, que, na verdade, tentava esconder uma tristeza. Mas essa fisionomia não demorou a mudar. Assim que a noiva bateu os olhos nas unhas da mãe...

- ROSA CHOQUE! ROSA CHOQUE! Nem no MEU casamento, mãe! MEU! Um dia na sua vida, um dia só, você não pode ser discreta? Não pode deixar de ser o centro das atenções? Tenho dó de você mãe, tenho dó. Olha lá a Dulce. Ela sim respeita o dia do filho. Respeita o meu dia. Ela pinta as unhas de rosa claro. Mas nãããooo. Rosa claro é muito chocho para a Senhora Ângela. Ela tem que usar ROSA CHOQUE!

Ângela não tentou se explicar. As últimas horas de sua noite, desde que tivera a terrível idéia de abrir o blush, passavam em sua mente enquanto escutava a bronca da filha e segurava o choro por tê-la decepcionado novamente. Mas ela sabia que Fabiana não escutaria sua história e, se escutasse, não acreditaria. E tinha razão. Foram anos de erros, anos arruinando sua relação com Fabiana. Neste momento, não havia o que fazer. Não havia um ombro para chorar. Não haviam amigos para desabafar. Estava sozinha. E sozinha, na primeira fileira da Igreja, fingiu que suas lágrimas eram, puramente, de emoção.

2 comentários:

Anônimo disse...

Achei q ia terminar bem.
Mas mesmo assim achei muito legal, to tao animado com seu novo blog

Anônimo disse...

COITADA da Angela... Se eu fosse ela, dava uma bela bronca nessa filha malcriada!!!