sexta-feira, 30 de maio de 2008

A partida de Karina

Se perguntassem a Karina se ela gostava de sua vida, se era feliz, creio que ela não saberia o que responder. Talvez pensasse por um momento, olhasse por um longo minuto para o rosto do interrogador, e, baseando-se na expressão deste, daria a resposta que achasse mais conveniente.

Um dia, aos dez anos de idade, ouviu de seu quarto sua tia convencendo os seus pais de que São Paulo era o futuro de sua linda sobrinha. Em São Paulo, seria grande. Em São Paulo, seria a menina mais inteligente que já houve na família Silveira. Em São Paulo, Karina seria feliz.

Por isso, quando seus pais e a tia perguntaram-lhe se era feliz na Bahia, o que acharia de se mudar para São Paulo, ficou parada apenas olhando para a cara dos três. Por tudo o que ouvira, deveria responder que queria ir para São Paulo. Mas e se fosse a resposta errada? Preferiu ficar calada.

- Vamos com a tia, Karina. Ela mora em uma casa grande, de um casal rico e simpático, que possui dois filhos, uma menina e um menino, dois amores de pessoa! Vamos conhecer gente nova! Lá tem cada comida diferente, tem tudo o que você vê no comercial na tevê. Vamos, Karina.

A menina olhou para os pais.

- Pode ser bom para você, filha. A tia cuidará bem de você, será sua nova mãe. Se quiser ficar aqui, tudo bem. Queremos o seu melhor. Se é feliz aqui... Mas tenho certeza de que será feliz em São Paulo

Karina já tinha ouvido falar de São Paulo antes. Quem não tinha? Devia ser como nas novelas. As casas nas novelas eram tão bonitas... Já pensou se essa casa que morava a tia fosse como as das novelas. Mas, se fosse, teria que ser do casal bom. Ela não queria morar com gente ruim. Pensou então em dizer que não. Mudou de idéia quando ouviu os grandes discutindo quando seria a melhor data da partida.

- É...- disse a menina.

- Partimos hoje, pode ser? – disse a tia.

- É, tia, mas antes quero contar pros meus colegas.

- Então aproveita hoje, que é hoje que volto. Se não, só no próximo feriado, e vai saber quando é.

Os pais mal tiveram tempo de dar um abraço na filha. Ela voou para a casa vizinha, onde morava a melhor amiga. Contou tudo, acrescentando fantasias e deixando que a amiga interferisse com tantas outras.

- Ouvi dizer que lá tem um parque cheio de piscinas enormes. Mil vezes maiores do que a que o pai da Sheila trouxe pra ela. E fundas também, mais fundas que o mar.

- Vou no parque todo dia!

- Queria ter uma tia em São Paulo também...

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