sexta-feira, 15 de agosto de 2008

E se morrer?

Dia após dia, Karina ia conversando consigo mesma sobre tudo o que via e ouvia.

Um dia, já com 15 anos, voltando do colégio para a casa, distraída com o pensar, atravessou a rua sem perceber o semáforo aberto aos carros.

Deu sorte. Justo naquele momento, apenas um carro estava passando, e não em uma velocidade suficientemente rápida que o impedisse de desviar da menina.

Houve buzinas. Mas nenhum acidente.

- Que louca. Nossa. Essa foi por pouco. Já pensou? E se eu tivesse sido atropelada? Até que não seria tão mal... Tem prova de matemática amanhã, eu não precisaria estudar. Se fosse feio, e eu morresse, nunca mais ia precisar estudar. Mas, pensando assim, que seria bom morrer, eu mesma poderia me matar, não precisaria de um carro pra fazer isso. Sem contar que se eu morresse atropelada, o motorista poderia ser preso, ficar traumatizado, e tal. Não. E se ele tiver uma filha? Coitada... Eu não ia gostar se minha mãe fosse presa só por que uma menina não quis estudar pra prova de matemática do dia seguinte. Quanto egoísmo! Seria horrível se minha mãe fosse presa por isso... O pior é que não é tão improvável assim acontecer. Acidentes de carro acontecem o tempo todo. O bom é que minha mãe não dirige, mas a Dona Ângela. Ai, já pensou se neste momento a Dona Ângela está se envolvendo em algum acidente de carro. Tudo ficaria muito diferente se a Dona Ângela morresse. Espero que não aconteça nada. O que poderia acontecer também é de o motorista que quase me atropelou ter ficado bravo. Vai ver agora mesmo ele está bem atrás de mim prestes a me lançar um tiro nas costas. Prefiro morrer a ficar um vegetal. Posso ficar paralítica também. Não sei se prefiro.

Chegou a casa e o pensamento deu um tempo com as distrações da hora do almoço. Karina nem se deu conta de quão macabros poderiam ser seus pensamentos. Ela não desejava morrer. Tampouco gostaria que algo de ruim acontecesse à sua mãe ou a Ângela. Ela simplesmente ia pensando, sem temer a morte. Ou melhor, temer a morte, até que ela temia. Só que, em momentos como esse, ela não estava preocupada com nada. Apenas pensava suposições. E achava normal.

Dia após dia, passou a imaginar formas improváveis de ser morta. Ou de que alguém próximo a ela o fosse. Cair no metrô, levar um tombo, pegar câncer, ser mordida por um cachorro...

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