sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Calor

Tem muito sol na piscina do clube A Hebraica de São Paulo. E muita gente com muita energia. Corre-se muito lá, apesar do calor que amolece o corpo.

Muita criança, muita mãe, muitas sacolas e mochilas e toalhas. Muitas cadeiras, mas menos do que adultos e crianças e mochilas e sacolas.

Nessas cadeiras, repousam alguns homens, algumas mulheres, meia criança e uma infinidade de mochilas e sacolas que em nenhum momento tocam o chão.

Nesse chão, feito de plataformas de madeira, pelando, forrado por toalhas, dezenas de pessoas que chegaram depois das sacolas e mochilas tomam sol desconfortavelmente. Livros, bóias, revistas, protetores solares, jornais e celulares preenchem os poucos cantos vazios que restam.

Os livros, revistas e jornais abertos abafam um pouco o barulho. São de quem tem os dedos manchados com tinta de impressora, sensível a suor com protetor solar. As mochilas e sacolas, privilegiadas sob os poucos guarda-sóis, não suam nem têm protetor solar. Aquele lugar lhes pertence. Ninguém as enfrenta.

Dez cartazes cobrem as grades da área da piscina. Dizem "Não guarde lugar", mas só são visíveis a quem está no chão. Para quem está nas cadeiras e sob os guarda-sóis, eles desaparecem, como num passe de mágica.

Por todo o lado, um barulho que não tem começo nem fim. Pertencente à piscina, está sempre lá, e sempre igual, desde 1986, o mesmo barulho de água, mãe e criança. Na mesma intensidade, no mesmo tom, no mesmo ritmo, no mesmo cheiro de cloro com protetor solar lotados.

A piscina da Hebraica não é uma piscina. É um emaranhado apertado de gente seleta. O ar quente condensa arrogância, mas não atinge quem, mesmo no chão quente, com dedos coloridos de tinta e melado por suor, consegue sentir, com a ajuda do barulho infinito, um delicioso cheiro de infância.

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