quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Doce Fonte, 2a e última parte

Nunca mais ninguém teria que pagar por açúcar. Bastaria que cada um se dirigisse à estrada e pegasse o seu.

Durante os dois meses seguintes, a compra de açúcar nos supermercados caiu para a metade. Havia dois grupos de pessoas que ainda não consumiam o açúcar gratuito: os desconfiados e, principalmente, os sem tempo.

Como “tempo” parecesse um motivo estúpido para que tanta gente gastasse dinheiro com açúcar, e como grandes fabricantes de açúcar estavam desesperados procurando algum outro meio de sobrevivência, surgiu uma nova profissão: os distribuidores de açúcar gratuito. Funcionava mais ou menos como água já funcionou. Não se paga pelo produto, mas pelo transporte e distribuição do mesmo.

No início, os distribuidores eram trabalhadores independentes. Cada um tinha cinco clientes, no máximo.

Com o tempo, porém, grandes empresários formaram grupos de distribuidores. Com dez, depois 50, até chegar a 200 funcionários cada. Agora, mesmo quem tinha tempo para buscar o próprio açúcar, encontrava dificuldade. As máquinas e equipamentos trazidos pelas novas empresas eram perigosos e, assim, somente “pessoas autorizadas” podiam se aproximar do local.

Em dois anos, o abastecimento do açúcar já atingia cinco Estados diferentes, e falava-se inclusive em exportação.

Nos jornais, a polêmica era quanto à estatização das empresas distribuidoras. Em casa, a polêmica era qual delas era a melhor. Uma oferecia, para cada dez sacos de açúcar, um achocolatado em pó feito com “açúcar natural”. Outra oferecia uma caixa dos mais novos cereais feitos com “açúcar natural”, ou, caso o cliente preferisse, uma embalagem contendo 50 saquinhos de adoçante. Outra oferecia, para cada dez sacos e mais 20 reais, uma bola de futebol. Outra não oferecia nada, mas tinha melhores preços. E outra iria sortear no final do ano uma viagem para Disney.

Não houve tempo para o sorteio. Faltando um mês para o fim do ano, o açúcar acabou. O Estado, ainda interessado em monopolizar a distribuição, precisou chamar especialistas para descobrir o motivo de a fonte ter secado: o consumo estava maior do que a produção. “E agora?”, perguntou o presidente. “Como podemos consertar isso?”. Não havia jeito. Era tarde demais. Não havia mais nem um grama de açúcar para se multiplicar. “E melhor ficar atento, senhor presidente, porque a água segue pelo mesmo caminho...”

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