segunda-feira, 3 de novembro de 2008

O falso suicida

É fácil.

Uma perna por vez,
Os braços ajudam.
Os pés tocam a estreita mureta
Por trás, no parapeito, as mãos seguram com firmeza.

E quando o corpo estiver para fora da sacada
Quando o vento bater no rosto e despentear o cabelo
Quando a respiração acelerar
Quando o pulmão apertar
Quando o frio vier
Quando o ouvido doer
Quando der sinestesia
Aí chega a tontura.

Basta então tirar,
Ao mesmo tempo,
Os dois pés do chão.

Não é tão difícil.

E quando o corpo estiver para fora da sacada
Quando os olhos desistirem de alcançar o infinito do céu
Quando imagens vierem
Quando da família se lembrar
Quando o coração apertar
Quando pelos amigos quiser chorar
Quando um abraço desejar
Aí chega a consciência.

Leva o tempo de um susto
A briga da vaidade e do egoísmo
Contra a gentileza e a generosidade

É impossível.

E quando o corpo estiver para fora da sacada
Quando os olhos desistirem de alcançar o finito da terra
Quando cada pêlo do braço arrepiar
Quando os dedos dos pés contraírem
Quando os joelhos afrouxarem
Quando as mãos tencionarem
Quando as lágrimas embaçarem as retinas
Aí chega o medo.

Uma perna por vez,
Os braços ajudam.
Os pés tocam o firme chão da varanda
Pela frente, no parapeito, as mãos seguram com firmeza.

Nenhum comentário: