terça-feira, 29 de julho de 2008

Colorindo (1a parte)

Virando à esquerda, encontrando finalmente o seu caminho, teve uma súbita vontade de levar a sério uma idéia antiga.

O semáforo ficou vermelho. Parou o carro. Era domingo, não havia nenhum outro veículo na rua, nem pessoas, a exceção de dois meninos de rua. A situação não poderia ser mais perfeita.

Um dos meninos começou a lançar bolas para o outro. Ela saiu do carro. Eles se assustaram, e pararam com as bolas.

- Preciso de uma ajuda.

- O que é? – perguntou um deles.

- Se eu disser vocês não vão acreditar. Prometo que não vou fazer nada de mal com vocês, mas vocês também têm que prometer que não farão nada de mal comigo. Não pretendo dar dinheiro para vocês, mas garanto que irão se divertir.

- Precisamos de dinheiro. Se formos com você, é um dia sem receber nada além do que já recebemos. Que não dá quase nada. Nosso pai é gente boa, mas o que que a gente vai falar pra ele quando chegarmos em casa?

- Ok, verdade. Não pensei nisso. Quanto vocês precisam?

- Cem reais pra cada um fecha.

- Haha! Eu também não sou besta! Vocês não fariam 200 reais aqui nunca!

- Então ficamos aqui.

- 50 para cada um? Mais o almoço de hoje.

- Ta fechado.

- Entrem aí.

- Oh, Cabeça, por que você que vai na frente? Sai daí, cara.

- Vocês revezam. Deixa o... Cabeça ir na frente agora. Qual é o seu nome?

- Pulu.

- Então, Pulu, você vai na frente mais tarde.

Entraram. Ela perguntou-lhes as idades. Ambos tinham 13. Mais ou menos. “Deve ser por volta disso”, disse Pulu, mais falante, deitado nos bancos de trás. Era a primeira vez que andavam de carro. Ela teve que insistir muito para que Cabeça colocasse o cinto de segurança. Ensinou a ele como se mexia no rádio. Ele ficou brincando de escolher música. Mas preferiu ouvir notícia. Ela tentou saber onde eles moravam, como viviam, mas:

- Faz assim: nós não perguntamos onde você mora, não perguntamos quanto dinheiro você tem, não perguntamos se você tem família, e você pára de querer saber da nossa vida.

Ela concordou. Só:

- Só me deixa eu perguntar mais duas coisas. Por favor. Se quiser não precisa responder. Do que vocês mais gostam na vida?

- Sei lá. Na vida não tem o que gostar não.

- Eu gosto de batata frita – respondeu Cabeça.

- É... Taí. Batata frita. Mandou bem, Cabeça.

- E se vocês tivessem todo o dinheiro do mundo, com o que gastariam?

- Essa é difícil dona. Vou ter que pensar.

- Então vai pensando porque chegamos no nosso primeiro destino: a loja de tintas. Vamos entrar. Eu vou pedir uma tinta roxa e uma rosa. Vocês podem escolher da cor que quiserem, mas não pode ser nem preto nem cinza. Nem amarelo.

- Pra que que é toda essa tinta? Vamos pintar sua casa? Hahaha

- Não minha casa. Mas vamos pintar. Vai ser divertido, confia em mim.

- Fechou. Cabeça, que cor você vai pegar?

- Azul. E você?

- Não sei. Mas olha que cor bonita naquela parede. É um verde claro.

- Chama verde-água.

- Vou querer essa aí.

- Então ta. É só pedir pra alguém da loja. Aí separem e me chamem pra pagar.

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